A coluna JC Negócios desta quinta-feira (06), assinada pelo jornalista Fernando Castilho no Jornal do Commercio, ouviu o tributarista Alexandre Albuquerque, sócio do escritório Ivo Barboza, sobre os impactos da MP 1.227/2024. Confira a coluna:
COLUNA JC NEGÓCIOS
Governo aceita desonerar 17 setores, mas aumenta arrecadação ao limitar compensações e vetar devolução de imposto pago a mais
A MP nº 1.227/2024 assustou não só a CNI como a CNA que estão emitindo notas de protesto.
Aconteceu de novo. Na mesma MP, ou projeto de lei em que anuncia um ajuste de algum programa tributário, o governo Lula inclui um novo pacote de medidas e acaba potencializando a arrecadação na medida em que impõe novas restrições ao contribuinte.
Desta vez foi na Medida Provisória nº 1.227, assinado nesta terça-feira (4) em que prevê condições para concessão de benefícios fiscais Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR revogou a possibilidade de ressarcimento e de compensação de créditos presumidos da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins.
A nova MP está sendo proposta como forma de compensar a desoneração da folha salarial para empresas de 17 setores e municípios mas, aproveita a oportunidade para vetar o uso de créditos obtidos em operações com o PIS/Cofins para compensar débitos de outros tributos federais e introduz uma nova prática fiscal que é a revogação das hipóteses de ressarcimento e de compensação de créditos presumidos relacionados às duas contribuições.
Parar a imprevisibilidade da arrecadação
Na verdade, o foco da MP é mesmo limitar a compensação de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal. Porque o governo avalia que essa situação traz imprevisibilidade sobre a arrecadação mensal na medida em que as empresas tinham autonomia para fazer a compensação na hora de recolher os impostos federais.
Mas o governo também aproveitou para aumentar suas receitas. Na prática, o governo estima que o impacto da desoneração da folha em 2024 é de R$26,3 bilhões, sendo R$15,8 bilhões para empresas e R$10,5 bilhões para municípios. As medidas de compensação, instituídas pela medida provisória, podem arrecadar até R$29,2 bilhões para cobrir essa perda de arrecadação, segundo estimativas do próprio ministério da Fazenda.
No dia 17 de março, o governo e o Congresso fecharam um acordo sobre a desoneração da folha de pagamentos, tanto para empresas quanto para os municípios onde foi mantida a desoneração no ano de 2024 e discutir a reoneração gradual a partir de 2025. Foi uma solução política encontrada depois que a União recorreu e obteve decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF) numa ação proposta pela Advocacia-Geral da União (AGU).
Governo quebra acordo de novo
Ficou acertado que o Ministério da Fazenda editaria uma nova MP para ajustar a perda de receita. Ela veio nesta terça-feira dentro de uma MP que delegou a competência para julgamento de processo administrativo fiscal relativo ao Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR e que incluiu a compensação de créditos presumidos da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins.
A MP nº 1.227/2024 assustou não só a CNI como a CNA que estão emitindo notas de protesto. Mas para o ex- senador Armando Neto, a nova MP é um fato grave porque agora se restringe a possibilidade de compensação ampla dos créditos. “Isso significa dizer que as empresas vão ficar acumulando o crédito e onerando o seu capital de giro prejudicando, portanto, setores exportadores e também restringindo a possibilidade de ressarcimento de créditos presumidos isso em prejuízo da agroindústria do setor de medicamento da indústria química”
Atualmente consultor da CNI, instituição da qual já foi presidente, Armando Neto não tem dúvidas que a nova MP trará impacto negativo imenso, porque gera um grande retrocesso tributário. “É muito estranho que o governo encontre uma forma tão gravosa para compensar a desoneração da folha que foi construída depois de um longo debate e de um acordo no Congresso Nacional.
Arrecadar mais para cumprir a meta fiscal
Monteiro Neto não está só. A finalidade da nova MP é mais um capítulo da mesma história do Governo atual: arrecadar mais para ver se cumpre a meta fiscal (que ninguém mais acredita), já que desde o início eles estão dizendo que o déficit zero será alcançado por aumento de receita e não diminuição de despesa, afirma o professor e tributarista Eric Castro e Silva.
O tributarista Alexandre Albuquerque avalia que o problema está no fato de que o governo tem um problema grave nas contas públicas. “O governo tem ampliado os gastos públicos e como contrapartida quer aumentar a carga tributária. Ocorre que o aumento da carga tributária sempre vem acompanhado do impacto na economia e confiança da administração Lula. Mas o preocupante é que o governo tem reiteradamente alterado as regras do jogo e isso estressa os agentes econômicos e políticos.
Albuquerque entende que com a MP 1.227/24, onde a empresa só poderá usar os créditos do PIS/Cofins para reduzir seus pagamentos do próprio PIS/Cofins vai exigir mais adequações. “ Essa medida parece simples, porém o que se busca é aos represar os créditos (que corresponde a tributo já pago) obrigar as empresas a pagar novos tributos.
Empresas empresas exportadoras no prejuízo
Tanto Albuquerque como Castro e Silva e Armando Neto alertam que os grandes prejudicados são as empresas exportadoras, as empresas que já apresentavam saldo credor em razão da cobrança indevida do PIS/COFINS, empresas do regime monofásico de tributação.
O viés arrecadatório estava presente na chamada de “MP das Subvenções” depois convertida na Lei nº 14.789/2023 as alterações na tributação de benefícios fiscais antecipou para antes da aprovação da primeira lei complementar prevista o fim da capacidade de os estados concederem incentivos fiscais como previstos na Reforma Tributária. A lei foi aprovada por ampla maioria e em Pernambuco o único voto contra do deputado Mendonça Filho (União Brasil).
Mas desde 1º de janeiro as empresas instaladas no Nordeste passaram a ser obrigadas a recolher o Imposto de Renda (25%), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (9%) e PIS-Cofins (6,5%) sobre o que concedem como Incentivos Fiscais para atrair empresas de regiões mais desenvolvidas e esteve na pauta da Reforma Tributária.
MP repete atitude do governo Lula
Como se sabe, o fim da política de incentivos fiscais foi um dos princípios que os governadores das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste aceitaram para apoiar a aprovação da Reforma Tributária, mas o que não contavam era que ao aprovar a Lei nº 14.789/2023, o Governo Lula na prática antecipasse seus efeitos. A questão está judicializada e dezenas de empresas já obtiveram liminares para continuar a usar os incentivos fiscais.
Agora a MP repete o formato e a mudança (sendo uma MP) passa a valer imediatamente e só será revertida se for rejeitada pelos parlamentares ou não for aprovada em 180 dias.
Até agora o uso de créditos tributários permite que as empresas paguem menos tributos, como isenções, imunidade, alíquotas reduzidas e créditos presumidos. Mas o governo Lula quer limitar o uso de todas as compensações, que neste ano, até março, somaram R$53,8 bilhões em estoque para restituição.
A cobrança de PIS/Cofins representa 25% do total de compensações para o não pagamento de tributos e chegou a R$62,48 bilhões arrecadados a menos em 2023. O objetivo do governo é que as empresas só possam usar os seus créditos tributários de PIS/Cofins para abater o pagamento do próprio tributo e não mais de terceiros.
Dificuldade da utilização dos créditos
Para o professor Castro e Silva, a MP traz duas medidas com aumento imediato de arrecadação: Ela dificulta a utilização dos créditos da não cumulatividade do PIS/Cofins e acrescenta mais uma nova obrigação acessória para os contribuintes que gozam de benefício fiscal, sob pena de multas altíssimas.
Pela nova MP as multas começam com 0,5% sobre o valor da receita bruta de até R$1 milhão; 1% até R$10 milhões e chegam a 1,5% sobre a receita bruta acima de R$10 milhões embora a penalidade seja limitada a 30% do valor dos benefícios fiscais.
O Ministério da Fazenda, afirma que as empresas continuam a ter o direito de abater a cobrança de PIS/Cofins com créditos (mas de acordo com a sistemática geral), mas não poderão pedir o ressarcimento em dinheiro, como estava sendo feito.
Busca o equilíbrio fiscal com arrecadação recorde
O governo também argumenta que está atendendo à exigência do Supremo apresentando uma medida que busca o equilíbrio fiscal como contrapartida da desoneração. Mas nega que o governo esteja tirando com uma mão e dando com a outra.
“Não necessariamente serão as mesmas empresas, mas podem ser as mesmas empresas”, disse. “São medidas diferentes, de escopo e âmbito diferentes, e podem afetar as mesmas empresas. É uma medida mais geral e não específica.” E que a compensação é maior para abrir uma margem de segurança na arrecadação.
Não é o que está acontecendo na boca do caixa: a arrecadação total das Receitas Federais atingiu, em abril de 2024, R$228.8 bilhões, crescimento real de 8,26% sobre abril de 2023. E no acumulado de janeiro a abril alcançou R$886.6 bilhões, representando um acréscimo pelo IPCA de 8,33%. Detalhe: a arrecadação do PIS/Pasep e a Cofins em quatro meses totalizaram R$169.3 bilhões, um crescimento real de 19,77%.